A CONVENÇÃO DOS
FERIDOS POR AMOR
Art. 1 - Todos os amantes, de qualquer sexo, ficam alertados que o amor,
além de ser uma bênção, é algo também extremamente perigoso, imprevisível,
capaz de acarretar danos sérios. Conseqüentemente, quem se propõe a amar deve
saber que está expondo seu corpo e sua alma a vários tipos de ferimentos, e não
poderá culpar seu parceiro em nenhum momento, já que o risco é o mesmo para
ambos.
Art. 2 - Uma vez sendo atingido
por uma flecha perdida do arco de Cupido, deve em seguida solicitar ao arqueiro
que atire a mesma flecha na direção contrária, de modo a não se submeter ao
ferimento conhecido como “amor não correspondido”. Caso Cupido recuse tal
gesto, a Convenção ora sendo promulgada exige do ferido que imediatamente
retire a flecha do seu coração e a jogue no lixo. Para conseguir tal feito,
deve evitar telefonemas, mensagens por internet, remessa de flores que terminam
sendo devolvidas, ou todo ou qualquer meio de sedução, já que os mesmos podem
dar resultados a curto prazo, mas sempre terminam dando errado com o passar do
tempo. A Convenção decreta que o ferido deve imediatamente procurar a companhia
de outras pessoas, tentando controlar o pensamento obsessivo “vale a pena lutar
por esta pessoa”.
Art. 3 - Caso o ferimento
venha de terceiros, ou seja, o ser amado interessou-se por alguém que não
estava no roteiro previamente estabelecido, fica expressamente proibida a
vingança. Neste caso, é permitido o uso de lágrimas até que os olhos sequem,
alguns socos na parede ou no travesseiro, conversas com amigos onde se pode insultar
o(a) antigo(a) companheiro(a), alegar sua completa falta de gosto, mas sem
difamar sua honra. A Convenção determina que seja também aplicada a regra do
Art. 2: procurar a companhia de outras pessoas, preferivelmente em lugares
diferentes dos freqüentados pela outra parte.
Art. 4 - Em ferimentos
leves, aqui classificados como pequenas traições, paixões fulminantes que não duram
muito, desinteresse sexual passageiro, deve-se aplicar com generosidade e
rapidez o medicamento chamado Perdão. Uma vez este medicamento aplicado, não se
deve voltar atrás uma só vez, e o tema precisa estar completamente esquecido,
jamais sendo utilizado como argumento em uma briga ou em um momento de ódio.
Art. 5 - Em todos os
ferimentos definitivos, também chamados “rupturas”, o único medicamento capaz
de fazer efeito chama-se Tempo. Não adianta procurar consolo em cartomantes
(que sempre dizem que o amor perdido irá voltar), livros românticos (cujo final
é sempre feliz), novelas de TV ou coisas do gênero. Deve-se sofrer com
intensidade, evitando-se por completo drogas, calmantes, orações para santos.
Álcool só é tolerado em um máximo de dois copos de vinho por dia.
Determinação final: os
feridos por amor, ao contrário dos feridos em conflitos armados, não são vítimas
nem algozes. Escolheram algo que faz parte da vida, e assim devem encarar a
agonia e o êxtase de sua escolha. E os que jamais foram feridos por amor, não poderão
nunca dizer: “Vivi”.
Porque não
viveram.
Autor: Paulo Coelho
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